Thursday 25 September 2014

cataclismo

Nada respira e momentaneamente eu até esqueço que é porque na verdade eu tenho asma e que eu sinto muito medo de pisadeiras porque elas tem cheiro e gosto e peso de desespero feito uma velha bem gorda e meio anã sentada no meu peito e como arde quando ela solta os cabelos em cima do meu próprio desespero e em cima dos tigres que eu derreti na minha parede. E eu já falei pro poeta cheio de palestinas, de faixas de gaza de respostas em poéticas de guerra que desencadear catarses é atividade principal de quem só se resta andando em carne viva. Arde com o álcool em cima da ferida ou quando tu dá um soco na parede e quebra as mãos e o muro não sai do lugar, mas qualquer lei da física deixa claro que tu socou a parede, mas é tu que tá sentindo o teu dedo sair do lugar e é tu que te ouve gritar antes de desmaiar porque nem pele tu tem mais pra ficar roxa antes do sangue jorrar por onde tu escreve e tu pensa em chamar alguém na esquina meio assim, ei meu chapa, fala aqui comigo, mas tu tá irremediavelmente desmaiado e afundado num soco no muro e quando tu acorda tem triângulos por todos os lados e tu já tá tão desconexo quanto o começo de um poema que era pra ser existencial e termina como um exercício vão de erotismo de quem tenta ser rebelde e até aí eu já abri as pernas pra qualquer outra coisa que não fosse tão violenta e qualquer coisa que não pareça muito comigo porque eu tenho medo dos espelhos terríveis que são olhos que abrigam mares inteiros e se qualquer coisa fizesse questão de me refletir eu ganharia sete anos de azar, menos sete vidas, menos dias sete, menos capítulos sete tocando a minha boca e o inferno riria na minha cara queimando as solas dos meus pés porque eu nunca viajei andando que nem um vagabundo iluminado e é na verdade porque a cidade é maldita na boca de deus, igual aos poetas que moram pra lá de mim e tu sabe que eu não cheguei aqui pra te dar tapas porque na verdade eu já te salpiquei todo de sangue porque tu, no fundo, sabe que sou só eu mesma esquizofrênica reverberando todos os cantos desgraçados e três pontos onde duas linhas se encontram que não passam de sexo e agora eu fecho as pernas porque me cansa que só me sobre hoje a noite uma masturbação de epifania e eu queria mesmo era estar sendo impiedosa jogando pedras no rio, fazendo ondas na água parada, tremulando cuspe pura bile até voltar a escrever tudo dentro das retinas de todos os poetas deitados num círculo de metal do marco zero e eu quero destruir a fragilidade do que não tenho mais e é frágil por só haver vazio e um copo meio cheio de bebedeira e o fato deu não conseguir deixar hematomas porque tenho punhos amarrados com a força de um monte de florzinhas vermelhas e tomara só que esse ruído todo pare de tentar explicar direito qualquer abismo.

2 comments:

  1. Caramba, é como um soco, um sopro, um resto de vida, ultimo suspiro, lágrima gelada, arrepio, primeiro beijo e despedida. Sensações semelhantes às quais senti depois de ler seu texto.

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  2. Enquanto te lia, tive a sensação de estar por um periscópio da alma observando o teu âmago. É admirável a sua intimidade com as palavras.

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