Friday 18 February 2011

As Questões Que Vêm Antes do Inverno.

A um futuro cientista social.

Formiga,
Como você tem consciência, nasci Cigarra. Nasci e desta forma permaneço, com a lente embutida n'alma para ver dessa minha forma multicor os dias se arrastando sem tempo definido. Pois bem, eis que canto, então. Como você diz, para distrair a vida dos tantos que caminham enfileirados. E convenhamos, a minha também. Segundo o seu pensamento de filósofo, as Cigarras tornam a vida mais suportável. Talvez a gente sirva pra respirar e desafogar os outros, porque olha que tem uma tempestade aqui dentro que está pior que essas chuvas que chegam à semana que vem.
Sabe, Formiga, estive observando seu ir e vir. Mas nunca lhe achei semelhante aqueles seus colegas de formigueiro. Cá da minha árvore eu reparo no seu andar variante e no jeito como você carrega as suas folhas. É diferente, sei que é. E também notei que, diferente das outras formigas, você volta e meia para ouvir as minhas cantorias, desde as mais agitadas até aquelas mais azuis, preguiçosas. Ouve sim, e até para, esbarra nos outros que eu já vi com esses olhos que a terra há de não tardar a comer. Ai, eu vi mesmo. E sabe que eu fiquei meio assustada? As formigas sempre me ignoraram demais, ou se limitavam a me pedir para trabalhar para não morrer de fome no inverno. Ora pois, eu sempre respondi que não queria e que é complicado pra uma cigarra viver até chegar o inverno.
E você? Você nunca me exigiu nada. Não ao menos com a voz. Porque eu senti já umas vezes os teus olhos me pedindo para cantar mais. Mais alto, mais música. E nossa, quando você vai e fica dias lá dentro do formigueiro, minha cantoria perde um pouco a graça e as minhas conversas com o vento de sobre como a natureza faz poesia se perde mais um tanto no farfalhar das árvores. Quando se encontra alguém pra ouvir, é para ela que se quer falar, entende?
Seu Formiga, eu te peço que não se irrite com as minhas alegações, mas lhe vejo como um revolucionário. A verdade é que você nasceu Cigarra e eu ainda não sei bem se lhe tiraram as asas, não. Acho que você está aí, só esperando. Só achismos, claro.


Fica aqui um bilhete bobo,

Cigarra.

Friday 11 February 2011

Segunda estrela, à direita.

Peguei tracinhos teus, a poesia que você me deixa ver, os pouquinhos de ti que reluziam mesmo diante da iluminação fraca e vim cá com minhas letrinhas te escrever um prosa. Talvez Sartre soubesse melhor de ti, já que te leu em Daniel. Mas eu volta e meia gosto de arriscar-me a descrever alheios que me formam. Como Rimbaud disse, o eu é outro. Talvez eu só esteja aqui te redigindo porque eu quero ser um pouco mais.
O que sei é que te escondes por vezes dentro daquelas fábulas. Não entendo bem se é por simples medo de crescer ou se é apenas pirraça da alma tua que é tão parecida com a de Che Guevara. Com suas devidas adaptações, claro, e viajando entre acordes de jazz e rock, sorrindo para o Bob Dylan - e devo dizer, sorrindo para ele junto comigo. A inocência revolucionária que te habita a alma desde um tempo que eu não sei lembrar. E tardes de domingo regadas às palavras de teus filósofos interiores. E quantas brigas eles já tiveram entre si. E tu? Tu sempre lá entre eles acabavas por ser atingido e sentir os vazios e as tristezas que a existência teima em plantar nas feridas que essas discussões abrem. Quando te aperta o peito essa sensação de sumir-se tu segues por outro caminho, voando com teu dedal que insistiram em por no teu dedo, pra te proteger do mal que for, da agulha que tentar te descer ao chão. E corres para Além-Mar, desfrutar um pouco dos teus mundos.
A verdade é que esqueces por vezes da poesia que te povoa, buscando achá-la no mundo. Deixe-me lembrar-te de não deixá-la fugir de ti, mas também não feche as tuas janelas, para não sufocar os versos. Ponha a tua música de novo e dance. Não esqueças de assinar teu nome, porque de vez em quando a assinatura lembra quem a gente é. Ou esqueças, dependendo do humor, do dia da semana, da cor que tu decidires usar. Não me deixa passar, por mais que tu gostes mais assim. Eu decido não ser nobre e sim eterna, mesmo que só por uns instantinhos. Só enquanto o correio demorar pra te levar a minha carta, quiçá.