Friday 21 September 2012

Nota de criado-mudo II

Ando tendo sonhos curiosos que sempre me remetem à alguma pintura do Escher. Talvez por ter ido à exposição dele há uns meses e aquelas figuras todas terem ficado carimbadas no meu cérebro. O último - há umas duas noites - era quase uma releitura daquela gravura das escadarias, sabe qual é? Nele, subo e desço infinitamente os degraus da escada de casa. A cada vez que termino a sequência de degraus, paro em algum lugar, mas não posso sair daquele perímetro, por alguma razão que eu nem tento entender. E é um daqueles sonhos onde é impossível parar de fazer o que se está fazendo e eu não reflito muito e continuo flexionando os joelhos, apoiando os pés, trocando o peso do corpo de uma perna para a outra. Então, o tempo passa, impertinente. O homem apodrecido e renovado faz com que o relógio voe e eu suba e desça, suba e desça, suba... desça. Até que os meus joelhos deixem de ser joelhos e se rompam no fim do que é físico. E a minha alma tem que subir e descer as mesmas escadas com os mesmo passos. Meu corpo não podia parar. Minha alma, menos ainda, porque não tinha joelhos.

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