Sunday 9 September 2012

Descaso com as batatas-fritas

O relógio marcou três e três da manhã e Madalena teve certeza de que permaneceria acordada até mais uma hora, independente de ter terminado ou não o dito trabalho de faculdade. Agarrou-se ao terço para aguentar bem àquela que diziam ser a hora maldita. Ela detestava tanto todos os minutos das três da manhã, que nem reparava nas horas iguais, que normalmente despertavam seu interesse - sabia de cor o que cada uma delas significava.
Rezou duas ave-marias e um pai-nosso, além daquela oração do anjo que as mães costumam ensinar pros filhos pequenos. Ficou apreensiva até dar três e quinze, mas foi terminar o trabalho - sempre com o rosário em mãos.
Às quatro e dois já havia concluído os slides com todas as exigências da ABNT e escovava os dentes encostada na porta do banheiro. Deitou-se logo depois, de barriga pra baixo, pois ouvira em algum lugar que o coisa ruim podia entrar pelo umbigo se ela dormisse de barriga pra cima.
Não tinha Maria na frente do seu segundo nome. Talvez por isso não fosse uma católica tão assídua. Metia de vez em quando o pé na igreja, mas era mais pelo excesso de superstição, que pela devoção em si. Sim, ela carregava sempre o rosário na bolsa. Mas, junto com ele, uma outra pá de amuletos, entre patas de coelho e olhos de boi, para as mais diversas causas. Francamente, sempre acreditou mais em astrologia e nos universos esotéricos do que nos santos. Mas se dispunha a proteger-se de todas as formas. E sempre que conseguia, evitava falar com pessoas de gêmeos, que dizia ser o seu inferno astral (pela minha falta de conhecimento do tema, não sei informar o signo dela).
Odiava gatos pretos e tinha táticas muito boas para desviar de todos. Não saía de casa em sextas-feiras 13 e justificava sua baixa estatura por ter passado embaixo de uma escada quando pequena.
Madalena não gostava de espelhos. Traumatizara-se com Bela Lugosi e seu Drácula que não refletia. Ademais, de supersticiosa que era, evitava ter espelhos para evitar quebrá-los (cá entre nós, acredito que ela tinha mais medo de quebrá-los por não gostar de ver-se repetida em tantos fragmentos, do que exatamente pelos anos de azar).
A despeito de muitos de seus medos, fascinava-se por Frankenstein. Não o do livro que ela nunca lera. Mas pelo Boris Karloff encenando o morto-vivo. Que aos olhos dela era vivo, embora feito de partes mortas. Irritava-se com Ygor, não por ser o assistente de índole duvidosa, mas por ser o Bela Lugosi.
Um dia desses quase morreu atropelada, coitada, tentando desviar das muitas rachaduras no chão. Sorte dela que só quebrou a perna. Curioso: o motorista era geminiano.
Deve ter sido culpa do saleiro que ela havia derrubado, um dia antes, na pastelaria.

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