Friday 16 July 2010

Para um certo par de olhos.

Não sentia-se a garota desarfotunada, ou triste, ou feliz. Na verdade, ela não sentia mais. Passava as horas com a sua música e seus versos, para ela, a única forma de recuperar algo de humano, qualquer pedacinho  que fosse, dos sentimentos tão queridos, tão quebrados.
Contentava-se em andar sem rumo pelas ruas, os fones no último volume, a observar as pessoas, os olhos.
Nunca conseguiu entender a exaltação das pessoas em relação a olhos claros. Porque isso? São bonitos, bem verdade, mas... São límpidos demais, calmos demais, incomumente comum demais.
Não. Ela gostava da confusão dos olhos castanhos. Dos olhos turvos de tempestade, do mistério das pupilas chocolate.
Eis que, um dia, em suas observações solitárias, encontrou um certo par de olhos. E sentiu-se inundar de calor, arrepiar-se sem explicação. Os olhos lhe diziam "oi", convidavam-na a entrar.
E foi ali que ela achou abrigo. Naqueles olhos tempestuosos de íris intensas de um menino doce. Não precisaria de nada além daquelas órbitas escuras de quem carrega a noite nos olhos.
Ela gostava, principalmente, de desvendar com a luz, o mistério dos olhos dele. Via, maravilhada, os dois círculos castanhos a mudar conforme a luz batia, as córneas separavam-se do castanho uniforme, que tornava-se mais claro. Suspirava, sorria e sorria de novo por sentir os lábios refletindo o sorriso interior. Sentia novamente.
Aprendeu a lidar com as emoções em cacos. Entendeu como enxergar em si, a força.  Cresceu para o mundo e para si. E os olhos dele a vigiá-la, faziam tão bem! O coração palpitava, irregular, cada vez que os olhos dela os encontravam. Pulsava-lhe pelo corpo a admiração. Queria enxergar o mundo assim, como aqueles globos marrons. De maneira tão real e tão otimista. Queria ter a coragem daqueles braços, daquele corpo que se aventurava ao mar. Admirava-o, então, por ser quem era. Amava o fato de poder ser, sem máscaras, junto dele. De mostrar-se ali, em detalhes, sem nem precisar esforçar-se. Ele a descobrira em meio ao nada.
Que falta ele fazia! Aprendera a ouvir a sua voz, a fazer-lhe carinhos, a passar os dedos pelos cabelos encaracolados e salpicados de mar, sentia-se capaz de pular de um penhasco, se fosse necessário para manter o abraço dele à sua volta, mesmo que por mais alguns segundos. Mergulhava nele, assim, quieta a ouví-lo falar. Fechava os olhos, e imaginava os dele também assim. Ria-se da sensação estranha que tinha em si, sempre que ele utilizava-se de "amor", como vocativo para chamá-la. Eram carinhos recíprocos, ciúmes ocultos, necessidade constante. Era o frenesi que ela tanto esperava.
Não, não era a placidez de olhos azuis que buscava, era aquela confusão opressora dos olhos castanhos que precisava. Sempre, junto dela, a mudar-lhe o interior. Um par ímpar de olhos, faiscando sobre os dela, até queimar.

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