Friday 23 May 2014

I want you to see what happens to heroes...

Se fosse mais fácil utilizar travelings daqueles bem produzidos, eu começaria isso com um no maior estilo Gus Van Sant em Elefante, seguindo o personagem principal da cena. Mas aquela câmera é cara pra caralho e os trilhos mais ainda e meu material se resume a umas teclas de computador recém-formatado, o que estraga com qualquer possível romantismo idealizado pelos admirados de carrega nos dedos a vontade de viver para escrever - necessariamente nessa ordem. Além do mais, o desenvolvimento do personagem em questão pede uma estética mais suja, talvez um freehand onde você esquece do lugar que tem que ver, por conta da falta de foco e o excesso de movimento.   No fim das contas, a narrativa vai descambar para este caminho, mesmo, com olhos que, na verdade, vão enxergar melhor isso daqui projetando imagens no cinema cerebral sem uma captação externa que vá muito além das letras. Ah, o problema de orçamento...
Nessa parte aqui poderia entrar um fade ou um truquezinho de edição que remetesse à flashbacks, mas talvez fique num tom limpinho demais.
Corta. Um corte seco.
Começos de dias de ressaca tem um gosto de cor indefinida e um desagradável bafo matinal que não sai com primeiros bocejos. Os olhos tem que se preocupar em reaprender a focar objetos, regular o obturador e coisa e tal. Linguagem fotográfica não é muito o meu forte. Zoom In. Bem na cara do nosso personagem principal, talvez com uma trilha sonora tal qual a de Pulp Fiction quando referenciam o Zoom In dos Shaw Broters. Tã taran taraã. Só pra ele despertar bem.
Mas a ressaca sempre revira o estômago e dormir de cabeça pra baixo não ajuda. Ainda bem que nosso protagonista sabe fazer piadas muito bem enquadradas sobre a própria desgraça.
As velhas-novas tatuagens sem nenhum significados, pintam uma tela disforme, desigual e desequilibrada no exterior igualmente sortido dessas mesmas características. Por sorte, essas desajeitações formam um quadro interessantíssimo de se combinar com uma estética trash que tem lá suas legiões de fãs. E sobre um sorriso de dentes tortos deslizam ao mesmo tempo as temperanças psicóticas e as cordas bambas emocionais. Frankenstein, talvez. Nem todo monstro é mau, não é mesmo?
Deixa essa parte em preto e branco.
Alguns monstros tocam em bandas inspiradas em filmes - isso se encaixaria em metalinguagem cinematográfica, se eu estivesse filmando - e se desfazem em lapsos de ódio descalculado que desabam numa chuva ácida de saliva e socos.
Alguns monstros usam máscaras de luchadores só para se esconder de si mesmos, já que a identidade secreta é pouco secreta. Mas baseando-se em filmes também, a vontade de disfarçar-se de vez em quando ganha a de parecer coerente. Que convenhamos, no caso dele, não se manifesta com frequência.
Posso voltar a trabalhar com cores aqui, no instante em que se colocam, simultaneamente - ainda não pensei bem em como aproveitar os cortes dessa cena - a máscara no rosto e um doce na língua.
Porque monstros vivem em fantasias - induzidas ou não. Na sequência, um joystick nas mãos, porque quando se nasce na geração do nosso monstro, aprende-se que, às vezes- quando se é um monstro, a reclusão interior (e exterior) nos acolhe com nintendos.
Talvez aqui as tatuagens de videogames façam algum sentido. Ele poderia dizer duas frases com a narração em off. Ele poderia estar fazendo parte de um roteiro sobre como um cara decide sair por aí mascarado lutando contra bandidos, mas tenho a leve impressão que Mark Millar pensou mais rápido que eu nessa. Alan Moore até, antes dele.
Mas dizem que idéias boas nunca surgem de uma cabeça só, então quem sabe?
Entre os pedaços dum Frankeinstein que se faz de fragmentos de cinema e música, o trabalho diz de si que viver pra arte pode não dar resultado sempre, mas rende partes novas.
Mais e menos humanos. Transitam em um limiar de pouca realidade e baques com paredes tão reais quanto os vômitos-por-beber-demais depositados nos encontros delas com o chão. Afinal, monstros também tem estômago.
Ele acorda com aquele gosto de ressaca de novo na boca.
Um outro corte seco, sem sentido.
E monstros, nem sempre são monstros.
Tela preta, créditos barulhentos e erros de gravações pra quem ficar até depois.

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