Tuesday 19 March 2013

Desatenção

a vida tem essas de desviar
como quando se dá
três passos
corridos
pra escapar da poça d'água
que os carros projetam em direção aos pedestres
[a maior parte deles
ainda carrega as mãos nos bolsos]

e tem umas de passar rápido demais
e xingar quem estiver no caminho
[mesmo que o sinal carregue vermelhos
ou tenha gente pedindo passagem]

e engarrafa-se toda
mas agora só na minha cabeça
porque não passam tantos carros assim na rua
de madrugada
por isso eu não entendo o meu medo

eu atravesso sem prestar atenção
com o frio na barriga de quem tá fora da faixa
mas não faz muita diferença
pra quem carrega a morte amarrada nos pulsos

2 comments:

  1. Essa analogia entre a vida e o trânsito é extremamente adequada, a meu ver. Porque nós realmente vivemos ora absortos na angústia dos engarrafamentos, ora em alta velocidade, sem nunca apreciar a paisagem. E são tantas as metáforas possíveis para o câmbio automático, o GPS, os painéis falantes e tudo isso que anestesia e tira a visceralidade da experiência... No trânsito, como na vida, é preciso um acidente muito barulhento, no mínimo, para nos acordar de verdade.

    Ótimo poema!

    ReplyDelete
  2. Eu adorei esse poema, achei do caralho e ainda o lance da morte amarrada no pulso deixa o leitor imaginando muita coisa.

    ReplyDelete